Dizem isso com frequência e facilidade, como se a ausência fosse sempre uma escolha. Como se estar presente fosse só uma questão de querer. "Quem se ausenta, deixa de ser lembrado." Mas e quando a ausência é defesa? E quando estar presente demais também adoece?
Às vezes, a gente se afasta pra respirar. Pra curar. Pra se refazer. Outras vezes, é o próprio espaço que vai nos empurrando pra fora. Devagar, pelas beiradas. Com silêncios. Com a sensação de que a gente precisa performar demais pra ser aceito. Que precisa gritar, entregar, agradar, se manter atual, constante, produtivo. Jovem. Disponível. Bonito. Presente.
É cansativo demais ocupar espaços que parecem ter sido desenhados pra outros corpos. Outras vozes. Outras geografias.
Sou do Recife, do Nordeste. E não é só um ponto no mapa, é um lugar que me atravessa, que me forma. E fico feliz quando lembram da gente, quando chamam pra mesa, quando querem ouvir o que vem de outras paisagens. Mas não pode ser só quando precisam de diversidade no post, de sotaque no vídeo, de uma “perspectiva diferente” pra completar o time ou pra cumprir a função de ser o token.
Sim, é bom estar ali. E sim, eu agradeço. Mas isso aqui não é reclamação. É só um cuidado em dizer: ter oportunidade não é o mesmo que ter espaço. E ser lembrada não é o mesmo que pertencer.
Tem também a idade e, com ela vem o olhar atravessado de quem acha que passou da hora. Como se existisse um prazo de validade pra ocupar certos lugares. Como se o tempo tivesse que nos calar. E se você é mulher, se é preta, se vem de fora do eixo… o tempo é mais curto ainda. E o barulho que incomoda não é o que você faz, é a sua existência.
Mas eu sigo, mesmo quando me ausento. Não tenho outra opção. Mesmo quando escolho o silêncio, mesmo quando não participo de todas as conversas, nem dos algoritmos, nem das bolhas. Sigo porque entendi que a presença pode ser outra coisa. Pode ser firme e serena, mesmo que não seja constante.
Eu não quero viver disputando espaço, quero tentar construir espaços, deixar raízes. Quero fazer parte de redes que não se rompem quando a gente se recolhe. Quero ser lembrada não porque estou gritando, mas porque o que construí tem raiz. E, talvez por isso, não paro de escrever, é o que sei fazer.
Então não, nem sempre quem se ausenta deixa de fazer falta. Às vezes, a ausência é só um jeito de lembrar ao mundo que a gente não tá aqui só para agradar. Tá aqui também para existir. E isso, por si só, já é revolução.
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