Fale Comigo (2022)

Ou: só adiciono com scrap.

Ah, o horror! O horror! Esse gênero que tantos desdenham e que tantos outros amam, eu incluída. No caminho de volta para casa depois de assistir à sessão de Fale Comigo, fiquei refletindo sobre as sensações que o filme me causou. Um só filme e tantos sentimentos. Do riso ao medo, ao susto, à empatia, à angustia e tantos outros. Dos sentimentos e sensações mais desagradáveis à mais reconfortantes e é justamente esse um dos pontos que me faz adorar tanto o gênero, ainda mais quando toca em pontos humanos tão em voga e sensíveis hoje em dia se utilizando de um subgênero clássico e já explorado que é o da possessão ou das maldições transmissíveis, como o que já tivemos esse ano no primeiro semestre o A Morte do Demônio: A Ascenção, ano passado o Sorria e em 2021 o Maligno, só para citar os mais mainstream.

Mesmo tendo sua primeira exibição em 2022 no Festival de Cinema de Adelaide (Austrália) e tendo sua estreia mundial no Festival de Sundance em janeiro de 2023, foi só em julho desse ano que A24 se juntou para distribuir o lançamento internacionalmente junto com os diretores, os gêmeos australianos Danny e Michael Philippou, responsáveis pelo RackaRacka, canal do Youtube do qual nunca tinha ouvido falar e isso não significa nada, mas parece que o canal é bastante conhecido por ter vídeos que mesclam terror, comédia e ação, inclusive já tendo sido premiado pelo conteúdo. Enfim, voltando...Fale Comigo é o longa-metragem de estreia dos gêmeos com roteiro de Danny Phillippou, Bill Hinzman e co-produção da Samantha Jennings da Causeway Films conhecida por Babadook, foram responsáveis por dar uma bela de entortada na já manjada história de adolescentes que dão de cara com maldições que te pegam e não largam mais.

Aqui, o tabuleiro Ouija dá lugar a uma mão embalsamada cujo background não sabemos muito, só que ela é uma chave que abre a porta para o mundo invisível do sobrenatural quando é feito o ritual de acender uma vela, tocar não mão e dizer as seguintes frases: “fale comigo” e “pode entrar”. Pronto, a brincadeira inconsequente ganha rumores esquisitíssimos. Mas, antes disso, o filme começa numa festa cheia de jovens e muitas bebidas, é quando somos apresentados sem aviso prévio do estrago que o uso repetitivo da mão pode causar: loucura e morte. Uma cena crua e enervante que pega a gente deveras desprevenido ao ponto de dar pulos na poltrona. Só que isso é só a pontinha do iceberg que é a trama, que acaba se revelando um horror familiar brutal sobre relações, amadurecimento, luto, ansiedade e solidão. 

Mia (Sophie Wilde) e Riley (Joe Bird) são amigos, dois adolescentes que estão buscando sua identidade no mundo, ela tem 17 e ele é mais novo, talvez uns 15/16 anos. Mia passa por uma fase difícil, tentando se recuperar de uma depressão após a perda da mãe por um suposto suicídio que está completando dois anos. Além disso, ela enfrenta uma relação turbulenta com o pai, pois o acusa de esconder a verdade sobre a morte da mãe. Ela é a melhor amiga de Jade (Alexandra Jensen) que é irmã de Riley e vivem apenas com a mãe, Sue interpretada por Miranda Otto. Jade namora Daniel que já namorou Mia e agora seguem sendo amigos, mas a solidão de Mia faz ela ser uma amiga carente e pegajosa, bom...é assim que os outros colegas a enxergam e na festa em que Mia entra pela primeira vez em contato com a mão, ela se sente deslocada. É na tentativa de se inserir e impressionar, que ela aceita ser a aquela a quem vai ter o privilegio de apertar pela primeira vez a mão naquela noite. Os amigos mais próximos tentam fazê-la desistir da ideia, os outros a instigam. Mia está decidida. Vela acesa, mão posicionada e o aviso: seu tempo com o espirito é de 90segundos. Uma pessoa fica responsável pela contagem do tempo, outra de puxar a mão de cerâmica e outra de apagar a vela que é o segredo para a “fenda do invisível” se fechar. Entre incautos e crentes, o bicho pega e Mia parece ter gostado da experiência e da sensação. A noite de jogos se repete na noite seguinte, dessa vez na casa de jade que aproveita a ausência da mãe para a “festinha”. Mas, quem brinca com jogos estúpidos, ganha prêmios estúpidos e é assim que Mia e Riley entram num espiral de tragédias com consequências nefastas não só para eles. 

No caso de Riley, praticamente uma criança, brincar com a mão não era o indicado, sua irmã mais velha não permite e nem os outros participantes também aconselham, mas Mia cede a vontade do amigo e ao invés dos 90 segundos, fazem o acordo de deixar apenas 50. Ok, do lado de cá a gente avisa: isso vai dar merda. Riley recebe a visita de uma entidade que seria supostamente a mãe morta de Mia. Pronto, fortes emoções e o que era pra ser uma visita de menos de 1 minuto, se transformou em 2 minutos e a entidade parece ter gostado de entrar no garoto. O tempo acordado não foi cumprido, a vela não foi apagada, aa mãos não foram soltas. Como consequência, ele começa a se agredir e a bater com a cabeça nos móveis numa sequência de cenas agoniantes! 

Bom, enfim, quem procura acha, o estrago já estava feito e o negocio é só ladeira abaixo, a vida deles, no caso, né, porque a trama vai se complicando e a gente vai gostando cada vez mais e se perguntando: aonde isso vai dar??

Fale Comigo é tudo isso sim que estão dizendo. Acredite no hype. O filme, além de ser sobre histórias clássicas de possessão e adolescentes reais quebrados necessitados de atenção, mostra nas entrelinhas também suas relações com pais desconectados de suas dores e anseios. Sejam elas novas ou velhas ansiedades, como a incerteza do futuro, o amadurecimento precoce a partir de uma perda ou o pertencimento em grupos. Acho bem interessante a entrevista dos diretores no Deadline quando fala sobre a questão de como jovens australianos são retratados em filmes, e eles quiseram dar uma cara de jovem mais australiano mesmo, já que é o que eles vivem e sabem.

Tudo parece abrir portas para que eles tenham experiências as quais os façam se sentir vivos e inseridos, na mesma entrevista, os gêmeos enfatizam as diferentes conexões que os jovens tiveram com a mão e fazem uma analogia com as drogas, as diversas experiências e de como as vezes a mesma droga não bate igual para todos. Além da forma como tudo é contado, o que torna essa jornada aparentemente comum em algo especial, é como ela foi filmada, seu ritmo, a atenção que dá a detalhes, principalmente ao som e quando foca nos olhares. Também a forma como foi encenada, feita diretamente para dialogar com nós, espectadores, seja em qual etapa da vida estivermos. 

Não queria terminar esse texto sem dar o devido destaque para Sophie Wilde, a atriz que dá vida a Mia, uma garota cheia de dor e de comportamento claramente autodestrutivo corroída em culpa pela morte da mãe. A gente sente sua angústia, sua dor, sua ansiedade, sua necessidade pelo toque, por sentir e por querer ser a amiga companheira. Uma coisa ou outra não funciona tão bem ou não é desenvolvida como a gente gostaria, mas nada que atrapalhe o desempenho central da história, já que as cenas de possessão entregam tudo de tão perturbadoras que são. Não a toa, o filme 2 já foi confirmado e espero que algumas arestas sejam preenchidas. Perturbador também é seu final, mas vou parar por aqui pois o gosto amargo que fiquei na sala de cinema, está voltando. Agora deixo para vocês que irão assistir. O filme estreia dia 17 nos cinemas. Vá, veja e depois Fale Comigo. 








Comentários

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  1. Já queria assistir, depois do aval da Tati é só certeza que vale ir no cinema assistir.

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    1. Ah, que bom! Torço pra que se divirta tanto quanto eu! <3

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  2. Putz, depois dessa mesmo morrendo de medo de "filme de sprito" fiquei com vontade de ver!

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    1. Hahaha! Assiste de dia e ai depois emenda uma comédia. ^.^'

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  3. Feedback do filme, realmente é muito bom. Certeira mais uma vez Tati.

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