A morte não faz barganhas e o pior não é saber que vai morrer, é a certeza de que ela está chegando. Só que no jogo de Oz Perkins, quem dita as regras do inevitável é o macaco.
A morte é a única certeza da vida, mas seguimos fingindo que ela está distante até que nos força a encará-la. Em O Macaco, Osgood Perkins transforma essa inescapabilidade em um jogo cruel, onde cada batida do tambor de um macaco mecânico anuncia mais uma perda. Diferente do terror sombrio e silencioso de seus filmes anteriores, aqui a morte não chega apenas como horror, mas também com uma pitada de humor perverso. Porque, no fim das contas, talvez o pior não seja morrer, e sim continuar vivendo sob a sombra do fim.
Essa inevitabilidade é o ponto de partida para a trama baseada no conto de Stephen King. O filme acompanha os irmãos gêmeos Bill e Hal, interpretados por Christian Convery quando crianças, que descobrem um velho macaco mecânico no sótão do pai. O que parecia um brinquedo inofensivo logo revela seu lado sinistro: a cada batida de seu tambor, alguém morre. Após uma sequência de tragédias, os irmãos conseguem se livrar do objeto e seguem suas vidas. Mas vinte e cinco anos depois, a maldição ressurge. Hal (Theo James), agora adulto e pai de família, percebe que o macaco voltou e desta vez, seu próprio filho pode estar em perigo.
O caminho desse conto até as telas, no entanto, quase foi outro. Após dirigir O Nevoeiro (2007), Frank Darabont manifestou interesse em levar a história para o cinema, mas o projeto nunca saiu do papel. Anos depois, coube a Oz dar vida a ele, e sua visão se afasta das adaptações mais clássicas de King para abraçar um tom próprio, misturando o trágico e o absurdo de um jeito inesperado. O filme já abre com um aviso claro: "ninguém escapa da maldição". A primeira cena nos leva a uma loja de penhores, onde um homem ensanguentado (Adam Scott) segura o macaco como se fosse dinamite prestes a explodir. É o pai de Bill e Hal, que há anos carrega o peso desse objeto maldito. Mas a morte não aceita barganhas. Antes que ele possa escapar, a maldição cobra seu preço de forma brutal, selando o destino que os filhos, anos depois, terão que enfrentar.
A ideia de um objeto aparentemente inofensivo carregando um poder mortal não é nova no terror, e O Macaco se encaixa nessa tradição macabra. O conceito de brinquedos amaldiçoados remete a filmes como Brinquedo Assassino (1988), em que a alma de um serial killer se transfere para o boneco Chucky, tornando-o uma ameaça debochada e mortal. Outra referência forte seria A Morte do Demônio (1981), que, embora tenha uma abordagem mais voltada para o sobrenatural, lida com objetos como o Necronomicon, mas dentro do contexto de objetos corrompidos e amaldiçoados. Em O Macaco, o brinquedo não é apenas um artefato de diversão, mas uma entidade aterrorizante. Com seu sorriso macabro e baquetas que batem sozinhas, ele se torna um símbolo do destino inevitável, ecoando o terror causado por outros brinquedos malditos.
Mas não é apenas o conceito do brinquedo que torna o filme aterrorizante, é também a forma como Perkins constrói essa atmosfera sufocante. A sensação de fatalismo permeia toda a narrativa, tornando cada som do macaco um lembrete fatal de que ninguém escapa do destino, como nas mortes meticulosamente orquestradas da franquia Premonição. A tensão cresce não pela dúvida sobre se alguém vai morrer, mas pelo quem e como. Visualmente, essa presença sufocante da morte é reforçada por sombras carregadas, enquadramentos claustrofóbicos e um uso de cores que faz o ambiente parecer à beira do colapso. Ao contrário de outros trabalhos do diretor, aqui a violência chega sem pudores, com mortes gráficas, bem-humoradas e impactantes.
E no centro dessa opressão visual e narrativa está ele: o macaco. Mas chamá-lo de brinquedo seria um erro. Seu olhar fixado e vazio, o sorriso medonho e seu tambor o tornam uma entidade quase mítica, a personificação do destino irreversível. Curiosamente, a história original de Stephen King apresentava um macaco batendo címbalos, mas no filme, ele foi substituído por um tambor. Segundo Oz Perkins, a mudança ocorreu porque um dos produtores acreditava que a The Walt Disney Company poderia deter os direitos sobre a versão do brinquedo com címbalos devido à sua aparição em Toy Story 3 (2010).
Esse cuidado com os detalhes, seja na construção visual ou na própria presença do diretor em cena, reforça a sensação de um destino inevitável. Oz Perkins, que já era reconhecido por suas direções em filmes como A Enviada do Mal (2015) e Longlegs (2024), faz uma participação especial no filme, inserindo-se diretamente no universo que criou. Seu breve papel não parece ser apenas um simples cameo ou easter egg para fãs atentos, mas talvez uma tentativa de reforçar a certeza de um destino inescapável, já que o próprio diretor, o arquiteto desse pesadelo, está presente dentro de uma história em que morre todo mundo. É como se ele sugerisse que nem mesmo o criador pudesse escapar da maldição, adicionando uma camada metalinguística ao terror.
Mas e aí, você deve está se perguntando: O Macaco é um filme completamente diferente do que ele já fez? Pode-se dizer que sim e que não, pois apesar das diferenças, ainda há muito do diretor aqui, principalmente o cuidado com a atmosfera, a forma como o medo se infiltra nos detalhes e a sensação constante de que há algo errado mesmo nas cenas mais tranquilas.
No fim, não se trata apenas de um filme de terror, mas de uma meditação cruel sobre a fatalidade da morte. Seu verdadeiro horror não está apenas nas mortes, e sim na certeza de que, por mais que tentemos escapar, a morte sempre nos alcança. E se não há escapatória, talvez reste apenas encará-la com um riso amargo. Com um tom inesperado para Oz Perkins, o longa pode dividir opiniões, mas não passará despercebido e, como sua tagline sugere, aceite a única certeza da vida de forma deliciosamente cruel.
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